Nove em cada 10 consumidores negros de classe A/B já sofreram discriminação em pontos de venda no varejo de luxo. Esse foi um dos achados da pesquisa ‘Racismo no Varejo de Luxo’, encomendada pela L’Oréal em 2024, que identificou ainda 21 dispositivos racistas na jornada de compra do consumidor negro. A resposta a dados tão alarmantes veio sob a forma do Código de Defesa e Inclusão do Consumidor Negro, desenvolvido em colaboração com a Black Sisters in Law, iniciativa dedicada à conexão, troca e crescimento de advogadas negras no Brasil e no exterior.
Lançado em parceria com o MOVER (Movimento pela Equidade Racial) e parte do Afroluxo, programa de longo prazo do Grupo L’Oréal no Brasil que visa o enfrentamento ao racismo no mercado de luxo brasileiro, o Código estabelece 10 propostas de norma, sem efeito jurídico, mas com valor moral com o objetivo de combater o racismo nas relações de consumo e transformar a experiência de compra da população negra nos pontos de venda. Segundo a head de comunicação e diversidade, equidade e inclusão da L’Oréal Luxo, Bianca Ferreira, a iniciativa está sendo implementada nas divisões da companhia no Brasil como um compromisso interno de autorregulamentação antirracista. “É uma ferramenta em legítima defesa de uma população historicamente excluída e que já nasce com o objetivo de, um dia, não ser mais necessária”, diz ela.
Conquistas do Código

A cerimônia de lançamento do Código, realizada no fim de abril, contou com a presença da escritora e intelectual Conceição Evaristo, que destacou: “Por muito tempo, nós, pessoas negras, não nos vimos representadas na beleza brasileira. Não havia batons, meias, nem produtos que valorizassem nosso tom de pele ou cabelo. Estética sempre foi política — e sermos considerados belos é um ato de afirmação. Hoje, ver uma juventude negra se reconhecendo como parte essencial da identidade brasileira e tendo acesso a produtos que celebram sua beleza é, para mim, uma conquista simbólica e histórica.”
Outro participante do evento, o ator e diretor Lázaro Ramos falou sobre o impacto social e moral da criação do Código: “Imaginem um Brasil em que nenhum desses códigos é mais necessário. Imaginem um Brasil em que consumidores negros são tratados como consumidores.” Já a diretora executiva do MOVER, Natália Paiva, ressaltou a força da ação coletiva para promover a equidade racial no setor, enquanto a jurista e fundadora da Black Sisters in Law, Dione Assis, discorreu sobre a importância de reinterpretar o Código de Defesa do Consumidor sob uma perspectiva afrocentrada.
Para quem comemora a novidade, vale saber que a ALLOS, administradora de 56 shoppings no Brasil, e a ABPS (Associação Brasileira de Perfumarias Seletivas) já se comprometeram a disseminar e adotar o Código entre seus parceiros e associados.
As 10 normas do Código de Defesa e Inclusão do Consumidor Negro

- O estabelecimento deve capacitar e treinar os funcionários e colaboradores em letramento racial.
- Vendedores e atendentes devem agir com presteza e atender prontamente consumidores negros.
- Deve ser vedada qualquer barreira, física ou simbólica, que restrinja o acesso e a livre circulação de consumidores negros no estabelecimento.
- É necessário agir com cautela ao abordar e revistar consumidores negros, o que deve ser feito somente mediante de provas inequívocas e apresentadas antes de qualquer revista.
- É preciso adotar medidas inclusivas que promovam a contratação de funcionários negros.
- O atendimento ao consumidor negro deve ser feito com respeito e dignidade e devem ser vedadas formas de tratamento discriminatório, incluindo comunicações estereotipadas ou ofensivas.
- O estabelecimento deve disponibilizar de forma clara, acessível e adequada informações sobre preços e condições de pagamento e vedar ao atendente informar verbalmente o preço de um produto sem solicitação prévia do consumidor.
- É recomendado garantir representatividade na publicidade.
- O estabelecimento deve manter estoque adequado e suficiente de produtos atendendo às características específicas de consumidores negros, incluindo diferentes tonalidades de pele e tipos de cabelo.
- É preciso adotar medidas inclusivas, entre elas capacitação técnica com formação e especialização para atendimento do consumidor negro.
