O Brasil é um país de maioria negra. Cerca de 56% da população se declara preta ou parda, segundo o IBGE, o que deveria refletir diretamente no mercado de consumo, especialmente na indústria da beleza. Entretanto, a realidade é outra: a oferta de produtos desenvolvidos exclusivamente para peles pretas e pardas ainda é escassa, mesmo diante de um mercado que movimentou impressionantes R$ 1,7 trilhões em 2023, conforme o estudo “Rotinas e Hábitos de Beleza do Consumidor Negro”, da Mintel.
Uma história de invisibilidade
Por décadas, a população negra foi invisível para o setor de cosmética brasileira. Apesar de ter consumidores ativos e de grande relevância para o setor, a oferta de itens que respeitassem as características únicas de sua pele — como subtom, textura e tonalidades variadas — era inexistente ou insuficiente.
O conceito de “desertificação cosmética”, cunhado pelo jornalista e maquiador Tássio Santos, ilustra bem essa realidade: ele aponta para a ausência de produtos que atendam às necessidades peculiares de consumidores negros. Em um país como o Brasil, onde a miscigenação resultou em pelo menos 144 tons diferentes de pele, segundo o Censo, isso significa que milhões de consumidores permanecem desassistidos em suas demandas.
Avanços tímidos, mas significativos
Nos últimos anos, iniciativas de inclusão começaram a ganhar espaço. Grandes marcas, pressionadas por consumidores e influenciadores digitais, passaram a investir em diversidade. Lançamentos de bases, corretivos e pós com uma maior gama de tonalidades demonstram um esforço para suprir lacunas históricas. No entanto, ainda há um longo caminho a percorrer.
Influenciadoras negras frequentemente relatam desafios em resenhas de produtos, revelando que, embora existam opções no mercado, nem sempre elas atendem à complexidade de tons e subtons das peles negras, evidenciando que a inclusão ainda é parcial.
Por que a diversidade importa?
Um levantamento inédito realizado pela Avon, em parceria com a consultoria Grimpa, destacou um dado preocupante: 70% das mulheres negras estão insatisfeitas com o mercado de beleza. Entre as principais razões para essa insatisfação, 46% afirmaram que o motivo mais comum para desistir da compra de produtos como base, pó ou corretivo é a dificuldade de encontrar um tom compatível com sua pele.
A pesquisa reforça a urgência de maior inclusão no setor de cosméticos, evidenciando como a falta de opções que atendam às características e necessidades da pele negra continua sendo uma barreira significativa para muitas consumidoras.
Por isso, o impacto de produtos que realmente atendem às necessidades da pele negra vai além do consumo. Eles carregam uma mensagem de representatividade e respeito. Cada lançamento que considera a diversidade dos tons e características das peles pretas reforça a ideia de que consumidores negros são valiosos e merecem ser ouvidos.
Essa conexão emocional fortalece a relação com as marcas. Quando o consumidor encontra cosméticos que respeitam suas necessidades e se sente representado, ele não apenas consome, mas também se fideliza, fortalecendo a marca em um mercado cada vez mais exigente.
Como as influenciadoras negras ajudam mulheres a aumentarem sua autoestima?
A representatividade importa, especialmente em um mercado de beleza que, por muito tempo, ignorou a diversidade das peles e dos traços da população negra. Nesse contexto, influenciadoras negras têm desempenhado um papel fundamental ao não apenas demandarem inclusão da indústria, mas também ao ajudarem outras mulheres negras a se reconhecerem, se valorizarem e aumentarem sua autoestima.
O poder da identificação
Uma das maiores contribuições das influenciadoras negras é o poder de identificação que promovem. Quando mulheres negras veem outras mulheres com tons de pele, cabelos e traços semelhantes nos holofotes, elas passam a se sentir representadas em um universo que historicamente as excluiu.
Influenciadoras como Nátaly Neri, Gabi Oliveira e Tássio Santos usam suas plataformas para mostrar que a beleza negra é diversa e merece ser celebrada. Ao compartilharem dicas de maquiagem, cuidados com o cabelo e experiências pessoais, elas quebram estereótipos e oferecem inspiração para que outras mulheres possam se aceitar e se empoderar.
Educação e autoestima
Além de promoverem representatividade, essas influenciadoras também atuam como educadoras. Elas ensinam sobre autocuidado e autoestima de forma acessível, compartilhando dicas que vão além do uso de produtos. Questões como aceitação do cabelo natural, cuidados com a pele e valorização da identidade negra são temas recorrentes em seus conteúdos.
Essa abordagem ajuda mulheres negras a ressignificarem a relação com sua própria imagem. Muitas relatam que, ao aprenderem a cuidar do cabelo crespo ou a escolherem a base ideal para seu tom de pele, se sentem mais bonitas e confiantes.
Desafios e conquistas
Apesar de seu impacto positivo, influenciadoras negras também enfrentam desafios no mercado de beleza. Muitas vezes, suas demandas por mais diversidade são ignoradas ou minimizadas, e elas precisam lidar com discursos discriminatórios.
Mesmo assim, elas seguem abrindo caminhos. Por meio de parcerias com marcas que valorizam a inclusão, elas estão conseguindo mudar o cenário e incentivar a criação de produtos que atendam às necessidades específicas da população negra.
Uma nova era de autoestima
A influência dessas criadoras de conteúdo vai além das redes sociais. Elas estão ajudando a construir uma nova narrativa para mulheres negras: uma narrativa onde a autoestima é fortalecida pela representatividade, pelo conhecimento e pelo autocuidado.
O impacto é evidente: ao verem suas características exaltadas e celebradas, muitas mulheres passam a se sentir mais seguras de si, reconhecendo sua beleza única e abraçando sua identidade.
As influenciadoras negras não apenas desafiam os padrões tradicionais de beleza, mas também incentivam a indústria a evoluir. Mais do que um nicho, elas representam um movimento que reforça que todas as mulheres merecem se sentir lindas e valorizadas.
Mês Consciência Negra e o futuro da indústria
No Dia da Consciência Negra, é importante refletir sobre o papel da indústria da beleza na promoção da equidade racial. Para um país tão diverso como o Brasil, a criação de produtos inclusivos deve ser mais do que uma tendência; precisa ser uma prioridade.
O mercado de beleza para pessoas negras não é apenas uma oportunidade econômica, mas também um compromisso social. Garantir que todos se sintam representados e respeitados é um passo fundamental para um futuro mais inclusivo e igualitário.